“Tudo era mais doce com o meu guri”. Ela não se cansava de repetir. A doçura de outrora deu lugar ao amargor da realidade, uma realidade que achara que jamais viveria, pois é natural que os pais partam antes dos filhos. Não é?!
Comecemos do início.
Iracema, este era seu nome. A doçura de seus virginais lábios fora maculada por Basílio, o primo insólito e indecoroso. Ainda muito jovens contraíram núpcias. As juras de amor eterno, a festa farta e os sorrisos dos convidados eram um atestado de felicidade eterna para o casal. Uma casa pequena cheia de filhos gorduchos e com saúde, já era o bastante para eles, afinal o que mais poderiam querer? É, acredite, isto era tudo o que eles queriam.
A noite de núpcias, a transformação da “moça donzela” em mulher casada. Não foi tão maravilhoso quanto ela esperava, mas Basílio lhe prometeu que isto mudava com o tempo. Iracema acreditou, pois como seria possível ela não crer no seu grande amor.
A rotina do lar se estabeleceu. Ele trabalhava para sustentar ela. Ela cuidava das roupas, da limpeza, da comida e do terreiro. O sexo? Era bom, mas lhes faltava algo, os filhos tão prometidos.
Tamanha foi a felicidade de Iracema ao saber que carregava o primeiro fruto de seu amor maior. A concretização de seus sentimentos por Basílio. Assim nasceu o primeiro, o segundo, e enfim o terceiro de seus filhos. Por mais que se negue, por mera convenção dos pais, toda mãe tem o filho preferido. E o de Iracema era o terceiro. Menino forte, cheio de princípios e com espírito de lutador.
Aos olhos da mãe o Guri era dócil, gentil e amável, a melhor de todas as crianças na face da terra. Sem notar, ele se tornou o mundo de Iracema. Os demais sobreviviam como luas que giram em torno de uma órbita pré-estabelecida, ajuntando as migalhas da afeição da mãe, e não se importavam, apenas buscavam se igualar ao Guri.
O tempo...
O tempo passou, ele sempre passa. O Guri cresceu e se tornou um rapagão. As tardes de farras imaginárias foram substituídas pelo labor. Os carros de brinquedo pelos carros de verdade da oficina na qual trabalhava. Afinal os carros se tornaram sua paixão e como toda paixão foram letais ao Guri.
Foi numa tarde de outono, folhas voavam ao léu com um vento uivante. Iracema sentiu seu peito apertar em uma breve taquicardia, ela apenas gritou: MEU GURI.
“Ah, meu Guri, tu partistes e me deixastes aqui” – a voz do desespero de uma mãe perante o túmulo de seu filho. Descabelada, ela chorava e gritava que aquilo não era de ordem natural, um filho partir antes de sua mãe, que era ela quem deveria estar no lugar de seu Guri.
O mundo perfeito foi sepultado com seu Guri. Basílio, não dotado da sensibilidade de Iracema, a deixou chorando sozinha sobre o túmulo do Guri. Ela se ergueu, graças as outras duas luas que orbitavam em seu mundo. Busca forças, mas tudo que faz, vê ou vive é pelo instante que encontrará seu Guri.
Outro dia a encontrei e ela apenas me sussurrou: “Tudo era mais doce com o meu guri”.
2 comentários:
Eu t falei né...q qdo li isso me arrepieiiiii. Mto triste a história =~
Este vale um AMSOP... bjos, agora sou sua seguidora.. ahuhau, sempre fui né..
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