sábado, 9 de janeiro de 2010

Crônica do fim anunciado


Não se pode prender um raio de luar.

Não se pode impedir o vento de soprar.

E nem mesmo a chuva de cair.

Ou o sol de nascer.

Por isso não posso lhe impedir de ir...

De me abandonar.

Foi há um ano. Exatos 365 dias, pois aquele não era ano bissexto. Ele se lembrava de cada segundo que precedia o fato de estar sozinho novamente. Sinceramente? Ele queria que isto acontecesse, não aguentava mais a rotina estressante de manter um relacionamento não apenas sexual com um ser do sexo oposto, as manias de outra pessoa lhe pareciam repugnantes. Os hábitos diários de Maria, este era o nome da pobre infeliz, a cada dia que se passava tornavam-se mais e mais nojentos, o simples bocejar de sua ex-amada lhe era insuportável.

Apesar de tudo, Pedro, este era o nome do nosso carrasco, não conseguia abandonar o hábito de ter Maria. Quão estranho lhe parece? Ele tem nojo, mas está habituado a isso? Sim. Era indefinível a sensação que sentia quando estava com ela, a desejava, mas a repudiava também.

Enquanto isso, Maria lhe devotava seus melhores dias, seus melhores pensamentos e seu melhor desempenho. Amava Pedro, isso era indubitável. Ele, aos poucos, se tornara sua água, seu ar e seu alimento. Gostava de pensar que ele pensava o mesmo ao seu respeito, que lhe dedicava as melhores horas do dia e seus mais doces pensamentos. Adorava ainda mais idealizar que um dia ele seria apenas seu. Ela não sabia do baque que estava por vir.

Pedro premeditara tudo por mais de um mês. Ensaiara palavras e gestos em frente ao espelho, pensou na roupa que vestiria e nas atitudes que tomaria, pressupondo inúmeras situações. Era tão cansativo imaginar Maria chorando, mas seguiu em frente com seu plano malévolo – ficar só. E era apenas isso que queria, não desejava a vizinha gostosa ou a colega de faculdade, apenas desejava ficar só consigo mesmo.

No dia programado para a morte de seu relacionamento Pedro saiu de casa. Tênis, jeans e camiseta preta. Enquanto repassava mentalmente seus gestos e dizeres, passava em frente a uma floricultura, estranha foi a ideia que teve. Entrou e comprou o mais belo buquê de rosas amarelas, as preferidas de Maria, e continuou seu árduo e longo caminho.

A campainha tocou. Maria correu alvoroçada para atender a porta, sabia que era ele, o dono de seu presente e futuro, o homem de sua vida. No olho mágico pode ver apenas as rosas. “Flores, as minhas preferidas...isso não pode significar outra coisa senão...”, flutuavam seus pensamentos enquanto a chave girava na fechadura, e isto tudo levou uma eternidade, na mente de Maria.

A porta se abriu. Pedro entrou. Os olhares se encontraram. Maria sorria. Pedro estendeu os braços, entregando as flores para a dama. Ela as recebeu com um sorriso inundando seus olhos. Antes que ela pudesse fazer ou dizer qualquer palavra, ele falou num tom baixo e sufocado: “Não quero mais, não te quero mais. Temos gostos divergentes e tudo em você me irrita, mas não quero que sofras. Apenas quero ser só, pensar somente em mim, não ter de dividir meus pensamentos e ações com outro ser humano”.

Maria boquiaberta perguntou apenas “Isto é tudo o que desejas?”. Teve um apático “SIM” como resposta. Apenas retrucou, “Então vá, não posso te prender a meus pés e nem mesmo obrigá-lo a conviver com alguém que não gostas”. Não houve choro e nem escândalo, as desculpas ensaiadas por Pedro teriam de ser guardadas para outra ocasião.

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